19/04/16

... não há erros nem culpa ...


«o destino, isso a que damos o nome de destino, como todas as coisas deste mundo, não conhece a linha recta. o nosso grande engano, devido ao costume que temos de tudo explicar retrospectivamente em função de um resultado final, portanto conhecido, é imaginar o destino como uma flecha apontada directamente a um alvo que, por assim dizer, a estivesse esperando desde o princípio, sem se mover. ora, pelo contrário, o destino hesita muitíssimo, tem dúvidas, leva tempo a decidir-se.»

josé saramago

... esta coisa da cozinha. desta coisa de ser moda. desta coisa de não ser nada daquilo que aparece. de precisar de alegria. de se trabalhar com o feio e dele ter que se extrair a beleza para colocar num prato. de magoar as mãos, de tudo ser agressivo, de tudo ser "em bruto". achamos sempre que há romantismo nestas coisas de cozinhar. associamos ideias que até desejamos que assim sejam. que tudo seja imaculado. tudo sem erros. e depois, depois nada é assim. perdem-se coisas, falhamos pontos disto e daquilo, esquecemos uma panela em cima do lume tempo de mais. perder tempo com a culpa é um disparate. um erro sobre um erro. a atenção precisa de estar onde precisa de estar sempre. no sabor. no que, afinal, é a razão de ser de se cozinhar com dedicação. o sabor. porque podemos ter o mais belo dos pratos mas se faltar esse elemento tudo o resto se perde. e para isso, para conservar esse sabor temos que esquecer o erro e culpa e rechear tudo de encanto, alegria e dedicação constante. só assim podemos dizer que cozinhamos para os outros e não para nós. que seja assim, sempre.